Ministro Wellington Dias visita entidade de São Paulo que teve contrato suspenso após suspeitas de irregularidades — Foto: ROBERTA ALINE/MDS/16-12-2024
RESUMO
Sem tempo? Ferramenta de IA resume para vocêGERADO EM: 13/02/2025 - 20:15
ONGs em Pernambuco e São Paulo têm contratos suspensos por irregularidades em programa de combate à fome
Uma ONG em Pernambuco apresentou CPFs inconsistentes em prestação de contas de programa de combate à fome,resultando na suspensão do contrato de R$ 3 milhões pelo Ministério do Desenvolvimento Social. Outra entidade em São Paulo também teve contrato suspenso por subcontratar ONGs ligadas a políticos petistas. Medidas de investigação foram acionadas.O Irineu é a iniciativa do GLOBO para oferecer aplicações de inteligência artificial aos leitores. Toda a produção de conteúdo com o uso do Irineu é supervisionada por jornalistas.
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Contratada pelo governo federal para fornecer refeições a pessoas em situação de vulnerabilidade social,uma organização não-governamental de Pernambuco apresentou uma lista com dados de beneficiários que inclui CPFs inconsistentes ou que pertencem a pessoas com nomes diferentes dos que contam na relação. Os documentos foram anotados à mão na prestação de contas da entidade,que firmou contrato de R$ 3 milhões com o Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) em novembro de 2024.
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Após ser questionada pelo GLOBO sobre as inconsistências,a pasta suspendeu o termo de colaboração com a entidade e disse que,caso sejam constatadas irregularidades,poderá pedir a devolução dos recursos já repassados à entidade. “O MDS reitera que,constatada qualquer irregularidade quanto ao cumprimento do objeto pactuado e quanto à boa e regular utilização dos recursos públicos,as devidas medidas saneadoras serão adotadas,o que pode incluir glosa e pedido de devolução de recursos à União,bem como inabilitação das cozinhas junto ao programa”,diz o ministério comandado por Wellington Dias.
A prestação de contas com os CPFs inconsistentes foi apresentada pela Associação da Juventude Camponesa Nordestina Terra Livre,que tem como vice-presidente Ana Lúcia Gusmão Brindeiro,funcionária do gabinete da deputada estadual Rosa Amorim,do PT,mesmo partido do ministro. Em nota,a entidade disse "que está disposta a investigar qualquer suspeita de irregularidade". Também procurada,a parlamentar disse o da assessora "não se relaciona com a função que a mesma executa na associação".
O presidente da associação Terra Livre,Sandreildo José dos Santos,afirmou que pode ter ocorrido erro no preenchimento da lista. Dos 400 nomes informados,o GLOBO identificou ao menos 150 CPFs inconsistentes.
O Cadastro de Pessoa Física (CPF),emitido pela Receita Federal,é um número único de identificação,com 11 dígitos. Os dois últimos dígitos são gerados por meio de um algoritmo e utilizados para verificar a validade do documento. Nos casos identificados pela reportagem,a sequência numérica não segue essa lógica.
— Nós temos alguns problemas. Essas cozinhas trabalham com povo de rua,muita dificuldade com documento. Mas se tiver indícios de ingerência,a gente vê — disse Santos.
O contrato da associação Terra Livre foi feito no âmbito do Programa Cozinha Solidária,ação de combate à fome do governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Para fornecer os alimentos,a ONG subcontratou outras entidades que atuam em diferentes cidades pernambucanas.
Uma delas foi a Uma Gota de Esperança,contratada para entregar as quentinhas em Paulista (PE),município de 342 mil habitantes na Região Metropolitana de Recife. A lista com os CPFs inconsistentes é atribuída à entidade. Questionada sobre os dados,a responsável pela ONG,Thais de Moraes Wanderley,culpa as próprias pessoas atendidas pelas informações prestadas.
— As pessoas,quando vêm buscar a comida,elas assinam,colocam o CPF e a data. Acredito que esteja acontecido isso. Elas dão "de cor" e devem informar qualquer número de CPF. Até eu estou abismada agora — disse Thais.
Entre os CPFs incluídos na lista de beneficiados pela ONG que distribui quentinhas está o de Jorgiana de Paula Wanderley Gomes,que Thais informou ser prima de seu marido. O nome atribuído ao documento na lista da entidade,contudo,é Erika da Silva. Questionada sobre a inconsistência,a presidente da entidade não respondeu.
Também procurada nesta quinta-feira,Jorgiana disse nunca ter recebido quentinhas de programas do governo. Pouco tempo depois,enviou uma nova mensagem à reportagem informando que conversou com Thaís e que o registro na lista se refere a uma "cesta solidária" recebida da ONG. Ela não explicou,porém,a razão de seu CPF ter sido atribuído ao nome de outra pessoa. Além disso,o fornecimento de cestas básicas não faz parte do programa Cozinha Solidária.
Há ainda ao menos outros cincos casos em que o nome atribuído ao CPF na lista da ONG não confere com os registros do próprio governo,como no cadastro de beneficiários do Auxílio Emergencial.
As suspeitas de irregularidades envolvendo a ONG de Pernambuco não é um caso isolado no Cozinha Solidária. Como revelou O GLOBO,o Ministério do Desenvolvimento Social contratou uma entidade comandada por um ex-assessor do PT para fornecer os alimentos na periferia de São Paulo. A associação Movimento Organizacional Vencer,Educar e Realizar (Mover Helipa),por sua vez,repassou verbas para entidades lideradas por atuais e ex-auxiliares de parlamentares petistas.
Após firmar contrato de R$ 5,6 milhões com o governo federal,a associação Movimento Organizacional Vencer,Educar e Realizar (Mover Helipa) subcontratou uma teia de ONGs de atuais ou ex-integrantes de gabinetes petistas para produzir e distribuir as quentinhas. O GLOBO visitou alguns dos endereços informados ao governo federal e não encontrou sinais da produção ou distribuição dos alimentos. Na ocasião,o ex-assessor parlamentar disse desconhecer se os alimentos não estavam sendo fornecidos e atribuiu ao acaso o fato de os subcontratados serem ligados ao PT.
A exemplo do que ocorreu com a ONG de Pernambuco,o contrato com a Mover Helipa também foi suspenso pelo ministério,que também acionou a Polícia Federal (PF) e a Controladoria-Geral da União (CGU) para investigar o caso.