Moradores de Niigata compram arroz em mercado da prefeitura local: variedade Koshihikari é a mais consumida no Japão,mas não tolera altas temperaturas — Foto: Noriko Hayashi/The New York Times
RESUMO
Sem tempo? Ferramenta de IA resume para vocêGERADO EM: 31/10/2024 - 20:56
Cientistas no Japão salvando o Koshihikari: Cruzamento Genético em Meio ao Calor
Cientistas no Japão buscam salvar o Koshihikari do calor extremo,cruzando sua genética com variedades resistentes. O arroz,líder de vendas,sofre com mudanças climáticas. Esforços visam preservar sabor e qualidade,em meio a desafios e incertezas.O Irineu é a iniciativa do GLOBO para oferecer aplicações de inteligência artificial aos leitores. Toda a produção de conteúdo com o uso do Irineu é supervisionada por jornalistas.
CLIQUE E LEIA AQUI O RESUMO
Cientistas no Japão estão correndo contra o tempo para salvar o arroz mais popular do país dos efeitos devastadores das mudanças climáticas.
Em um centro de pesquisa na província de Niigata,a região montanhosa e central para a produção de arroz no Japão,uma equipe de cientistas identificou um padrão no DNA do grão que torna certas variedades da planta resistentes ao calor.
Nova linha aérea: companhia aérea de baixo custo espera transportar 5 mil pessoas por mês em nova rota entre Rio de Janeiro e MontevidéuMíriam Leitão: Quem é pior para o Brasil: Kamala Harris ou Donald Trump?
Agora,eles estão embarcando em uma missão para cruzar essa característica genética com o Koshihikari,o arroz japonês que lidera as vendas nos supermercados do país há mais de 40 anos.
O sucesso ou fracasso dessa empreitada pode determinar o destino desse alimento,amplamente considerado o “rei” do arroz entre os japoneses.
Um bowl de arroz Koshihikari,que por gerações tem sido o orgulho da principal região produtora do grão do Japão,na província de Niigata,— Foto: Noriko Hayashi/The New York Times
Arroz era classificado como de primeira linha
No ano passado,a plantação de arroz Koshihikari em todo o Japão foi devastada pelo verão mais quente já registrado. Comparado a outros tipos de arroz,o Koshihikari tem uma tolerância particularmente baixa ao calor,e as temperaturas escaldantes tornaram seus grãos opacos e quebradiços.
Esse foi um golpe devastador para os agricultores em Niigata,onde o arroz Koshihikari é o maior produto agrícola da economia local.
Mercado de trabalho: Desemprego cai para 6,4% em setembro,o segundo menor da série histórica
No ano passado,menos de 5% do arroz da província recebeu a classificação de qualidade superior,permitindo que fosse vendido a um preço mais alto — cerca de US$ 6 ou US$ 7 a mais por saco de 60 quilos. Ao longo da última década,normalmente cerca de 80% ou mais do arroz Koshihikari de Niigata era classificado como de primeira linha.
Uvas de Bordeaux e cacau da África não escapam do calor
O Koshihikari é uma pequena parte de uma indústria agrícola global que está sendo afetada pelo aumento das temperaturas. Desde produtores de uva na região de Bordeaux,na França,até colhedores de cacau na África,os agricultores têm sido forçados a modificar práticas que estão em vigor há gerações.
O calor também está afetando a produção de arroz em outros centros agrícolas da Ásia,como Vietnã e Tailândia.
— A questão é,em última análise,muito maior do que o Japão — disse Charles Hart,analista sênior de commodities da BMI,uma unidade da empresa de pesquisa Fitch Solutions. —O arroz exige muita água,e em um contexto de aumento gradual das temperaturas e períodos mais frequentes de calor intenso,o arroz resistente ao calor precisa ser o caminho a seguir — afirmou Hart.
Sacos de arroz Koshihikari,que por gerações tem sido o orgulho da região produtora de arroz do país,na prefeitura de Niigata — Foto: Noriko Hayashi/The New York Times
No Japão,onde o governo utiliza tarifas para limitar as importações de arroz,a colheita ruim de Koshihikari no ano passado contribuiu para uma escassez generalizada de arroz neste ano. Prateleiras vazias nos supermercados geraram pânico e levaram a pedidos para que as autoridades japonesas liberassem as reservas estratégicas de arroz do país.
— Para nós,o verão passado foi um choque extremo — contou Kazuyuki Kobayashi,especialista técnico no Instituto de Pesquisa Agrícola de Niigata,fundado em 1895.
Plantação na mesma família há 300 anos
Isso,segundo ele,deixou os cientistas do centro de pesquisa correndo para desenvolver novos tipos de Koshihikari capazes de suportar esses períodos de calor extremo.
— Estávamos desenvolvendo arroz com base em projeções de como as temperaturas aumentariam até o final do século 21— disse Kobayashi. No último verão em Niigata,“essas temperaturas já haviam chegado”,afirmou.
O agricultor Shingo Kuwabara em seu campo de Shinnosuke,um arroz desenvolvido pelo Instituto de Pesquisa Agrícola de Niigata,capaz de suportar temperaturas extremas — Foto: Noriko Hayashi/The New York Times
Em um dia nublado de setembro,Shingo Kuwabara,de 38 anos,estava no meio da colheita de Koshihikari quando uma chuva intensa o obrigou a fazer uma pausa em local coberto. Kuwabara cuida de quase 40 hectares que estão em sua família há mais de 300 anos.
A fazenda de Kuwabara fica na região de Uonuma,no sul de Niigata — uma área conhecida por produzir alguns dos melhores Koshihikari do Japão. O derretimento de neve rico em minerais das montanhas ao redor mantém os arrozais úmidos. Brisas frequentes e chuvas à noite ajudam a manter as temperaturas frescas.
Temperaturas 6°C acima do ideal para o cultivo
No verão passado,a fazenda de Kuwabara e áreas vizinhas foram atingidas por temperaturas acima dos 30°C — cerca de 6°C mais quente do que a temperatura ideal para o cultivo de arroz. Kuwabara disse que,com isso,menos de 40% do seu Koshihikari recebeu a classificação de primeira linha.
— Outros agricultores e eu frequentemente conversávamos sobre como poderia haver um limite para cultivar Koshihikari no futuro — disse Kuwabara,acrescentando que,no ano passado,“vimos muitos de nossos grãos de Koshihikari ficarem brancos".
Há cerca de uma década,Kuwabara começou a cultivar uma pequena quantidade de Shinnosuke — um arroz desenvolvido pelo Instituto de Pesquisa Agrícola de Niigata,capaz de suportar temperaturas extremas. Durante a onda de calor do ano passado,as plantações de Shinnosuke de Kuwabara permaneceram saudáveis.
O arroz Shinnosuke,que pode crescer em condições mais quentes,é colocado para secar no Instituto de Pesquisa Agrícola de Niigata,onde a variedade foi desenvolvida — Foto: Noriko Hayashi/The New York Times
O Shinnosuke representa apenas 5% do arroz de Kuwabara. Mas,se as temperaturas continuarem subindo como agora,até que ele passe a fazenda para a próxima geração,o Shinnosuke poderá representar cerca de metade da produção da fazenda,disse ele.
O Shinnosuke tem algumas desvantagens. Ele tende a ser infectado por fungos,e varejistas de arroz em Niigata dizem que os consumidores ainda preferem o sabor do Koshihikari,de grãos menores.
Muitos agricultores em Niigata,no entanto,dizem que relutam em se afastar do Koshihikari. Ele tem sido,há muito tempo,o orgulho de Niigata,proporcionando às famílias uma renda estável por gerações.
O agricultor Shingo Kuwabara mostra um punhado de Shinnosuke,um arroz criado pelo Instituto de Pesquisa Agrícola de Niigata,que é capaz de suportar temperaturas extremas — Foto: Noriko Hayashi/The New York Times
O incentivo para a mudança é especialmente baixo para a maioria dos agricultores japoneses,que estão em idade de aposentadoria ou mais velhos e não têm herdeiros para assumir suas terras.
— É uma aposta,decidir se aumento o cultivo de Shinnosuke ou não — disse Kuwabara. — Por enquanto,tenho esperança de que o Koshihikari seja desenvolvido como uma cultura resistente ao calor— afirmou.
15 anos para desenvolver novo tipo de arroz
Pesquisadores agrícolas no Japão dizem que a chave para cultivar um novo tipo de Koshihikari resistente ao calor pode estar no DNA de outros arrozes,incluindo o Shinnosuke.
No Instituto de Pesquisa Agrícola de Niigata,os cientistas identificaram uma sequência de DNA que,segundo eles,poderia dar ao Koshihikari a capacidade de suportar calor extremo. O processo de introduzir essa sequência especial de DNA no arroz é trabalhoso.
. Cientistas do Instituto de Pesquisa Agrícola de Niigata,no Japão,estão correndo contra as mudanças climáticas,explorando o DNA ideal para criar uma variedade cruzada do popular arroz Koshihikari,que seja mais resiliente em condições de cultivo mais quentes — Foto: Noriko Hayashi/The New York Times
Os cientistas do centro de pesquisa dizem que leva de 10 a 15 anos para desenvolver um novo tipo de arroz do início ao fim. Com a rapidez com que as temperaturas mudaram nos últimos anos em mente,a equipe está se esforçando para concluir o processo dentro dos próximos 10 anos.
Nos vastos campos atrás dos prédios principais do instituto,os pesquisadores estão cultivando híbridos de Koshihikari com outros grãos de arroz resistentes ao calor. Esses híbridos serão cruzados novamente com Koshihikari,e esse processo será repetido até que obtenham um arroz que seja igual ao Koshihikari em todos os aspectos,mas que também suporte o calor.
Qualquer nova variedade “deve ser tão deliciosa quanto o Koshihikari sempre foi”,disse Kobayashi:
— Caso contrário,os agricultores não vão querer cultivá-la.
Aderência,umidade,formato e brilho testados
Grãos dos candidatos resistentes ao calor que mostrarem potencial passarão pela sala de testes de qualidade do centro de pesquisa,onde máquinas verificarão sua aderência,formato e brilho. Um painel de especialistas testará o aroma e o sabor do arroz cozido pelo exército de 50 panelasdo centro.
Por fim,um Koshihikari resistente ao calor será selecionado,e suas sementes serão distribuídas aos agricultores em Niigata.
Campos de arroz na região de Uonuma,onde é produzido um dos melhores arrozes Koshihikari do Japão,no sul da província de Niigata — Foto: Noriko Hayashi/The New York Times
Em busca da sequência de DNA ideal
Somente neste ano,pesquisadores do Instituto de Pesquisa Agrícola de Niigata já examinaram dezenas de milhares de amostras híbridas de arroz em busca da sequência de DNA ideal.
Takeshi Shiraya,um pesquisador-chefe do instituto,realiza esses testes usando uma máquina que gera imagens do DNA do arroz que se parecem com códigos de barras: duas faixas nítidas indicam que o arroz possui a característica desejada e pode ser plantado nos campos de teste ao ar livre.
Acima da máquina de Shiraya,alguém de sua equipe colocou um pequeno santuário de madeira dedicado a colheitas abundantes de grãos. Ele disse que o gesto era significativo.
— Nossa tarefa aqui é 99% esforço —disse Shiraya,acrescentando que o último 1% “fica nas mãos dos deuses".
Webstories