Transplantes com HIV: laboratório que deve substituir PCS recebeu R$ 6,2 mi sem licitação

A sede da Fundação Saúde,no Rio Comprido — Foto: Márcia Foletto/Agência O Globo

A empresa Blessing Análises Clínicas está perto de se tornar a substituta do PCS Lab Saleme na prestação de serviços para 13 unidades da rede estadual de saúde do Rio. A troca é negociada após o escândalo dos transplantes com órgãos infectados com HIV,que veio a público no último dia 11 de outubro e pelo qual o PCS — responsável pelos testes falhos — foi interditado. Desde então,a Secretaria estadual de Saúde (SES) busca os concorrentes derrotados no pregão eletrônico,de outubro de 2023,que havia culminado na admissão do PCS. O segundo colocado no processo declinou da proposta,abrindo caminho para o Blessing,que já enviou documentação ao governo e deve assinar um contrato emergencial.

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Não será a primeira vez,no entanto,que a empresa atuará no estado sem licitação: desde 2022,é desta forma que o Blessing recebeu R$ 6,2 milhões da Saúde fluminense. A maioria dos valores foi relacionada ao Hospital estadual Azevedo Lima (HEAL),em Niterói. Nos dois últimos anos,por exames na unidade,o laboratório obteve R$ 5 milhões em 17 pagamentos por Termos de Ajuste de Contas (TACs),feitos quando não há uma cobertura contratual para um serviço prestado. Nessas ocasiões,há um acordo por comodato: a empresa faz todos os exames que o hospital solicita e,depois,cobra do governo,enviando comprovações de que realizou as análises. No fim,é feito um TAC,e o montante é pago ao fornecedor.

De OS à Fundação Saúde

Como O GLOBO vem mostrando nas últimas semanas,os TACs e as contratações emergenciais — que deveriam ser excepcionais — têm superado as feitas com licitação na Fundação Saúde,que administra as unidades de saúde do estado.

No caso do Blessing,a empresa já operava no Azevedo Lima quando o hospital era gerido por uma Organização Social (OS). A Fundação Saúde passou a administrar o HEAL em abril de 2023,quando pediu para que o laboratório — e outras empresas terceirizadas — continuassem suas atividades com a finalidade de garantir que não houvesse “interrupção do serviço público,garantindo-se a indenização”,como escreveu a diretora administrativa financeira Alessandra Pereira,em um ofício dias antes de a Fundação assumir o hospital.

À época,para assumir como diretor-geral da unidade,o escolhido foi o ortopedista Marcus Vinicius Dias. O médico é o mesmo que,na semana passada,em meio à crise dos transplantes infectados,foi nomeado como novo diretor executivo da Fundação Saúde. Ele assumiu o lugar de João Ricardo Pilotto,exonerado após toda a diretoria da empresa pública colocar os cargos à disposição.

As conversas entre o Blessing e o governo fluminense para que o laboratório substitua o PCS Lab Saleme,começaram antes mesmo que Pilotto fosse exonerado e o nome de Marcus Vinicius Dias fosse cotado para a função. Além disso,a Fundação Saúde afirma que as chefias dos hospitais “não participam da contratação dos prestadores de serviço”.

A empresa pública sustenta ainda que a necessidade dos TACs ocorreu porque,até 2020,a fundação era responsável por apenas 11 unidades. Mas,por causa de uma lei estadual que determinou o fim da gestão por OSs no Rio,o número saltou para 65. “Essa transição exigiu a contratação,de forma emergencial,de fornecedores e prestadores de serviço,para que não houvesse descontinuidade da assistência à população”,alegou.

De acordo com a empresa pública,a documentação enviada pela Blessing está sendo analisada para atestar sua capacidade técnica de absorver o volume de exames necessários para atender as 13 unidades da rede previstas no contrato emergencial. “Logo em seguida,a Fundação inicia a elaboração do processo licitatório”,diz,em nota.