"Há populações no interior que estão a ser abandonadas pela banca"

"A exclusão bancária está a aumentar,o nosso estudo de 2022 já apontava nesse sentido e vem aumentando",disse à Lusa o economista Nuno Rico,da Deco,para quem o impacto sente-se sobretudo em zonas do interior,onde há populações mais velhas e com mais dificuldade em usar meios digitais.

 

"Esta banca está a deixar de ser para velhos. Há claramente populações no interior do país que estão a ser abandonadas pela banca. Isto agravou-se" desde o estudo feito pela Deco em 2022,acrescentou.

O estudo da Deco,de 2022,considerava que "o peso de uma banca cada vez mais longe de casa e cada vez mais cara está,sobretudo,aos ombros dos mais idosos",com o fecho de balcões a ter impacto no interior onde uma deslocação a uma agência pode implicar dezenas de quilómetros.

Então,dava o exemplo de que um cliente do BPI de Vilar Formoso que tinha de fazer mais de 72 quilómetros (ida e volta) para ir à agência do seu banco mais próxima,em Figueira de Castelo Rodrigo,e de alguém de Barracos cliente do BCP que tinha de fazer 140 quilómetros para ir ao balcão mais perto,em Reguengos de Monsaraz,e voltar a casa.

O Público noticia hoje,em manchete,que a Caixa Geral de Depósitos (CGD) "reduz serviços no interior e ilhas" ao transformar dezenas de agências que até aqui ofereciam todos os serviços (designadamente levantar e depositar dinheiro ao balcão) em espaços mais pequenos e com menos serviços.

Em 03 de outubro,a Lusa noticiou um comunicado da Comissão de Trabalhadores do banco em que esta denunciava aquilo que dizia ser o "incumprimento" da CGD do "dever de serviço público bancário".

Hoje,em declarações à Lusa,o presidente da CT da CGD,Jorge Canadelo,disse que este problema se está a colocar sobretudo em agências do interior de Portugal continental e das ilhas e que isso é feito pondo em causa a sustentabilidade da empresa no futuro e sem qualquer "visão crítica" da tutela,o Governo.

"O acionista [o Estado] tem tido rendimento,mas estamos a minar a coesão [do país] e a dar cabo da sustentabilidade futura [da CGD]. Quando acabar o diferencial das taxas de juro [principal contribuidor dos lucros do banco] não sabemos se teremos matéria-prima para gerar mais lucro",afirmou Jorge Canadelo.

Sobre a CGD,o economista da Deco Nuno Rico considera que há "uma agravante" em o banco deixar de prestar serviços em algumas zonas pois tendo "capitais públicos teria a obrigação moral de pelo menos não contribuir para este abandono dos clientes mais idosos".

Questionada pela Lusa,fonte oficial do banco público afirmou que "é completamente falso que a CGD esteja a reduzir serviços,nomeadamente no interior ou nas ilhas" e que "só por manifesta má-fé o investimento superior a 70 milhões de euros que a Caixa está a realizar sua extensa rede de agências pode ser entendido como recuo de serviços,quando o mesmo se insere num plano de transformação digital que visa servir mais e melhor os seus clientes onde quer que eles estejam".

Segundo a CGD,a criação de agências de nova geração "não deixa ninguém para trás e aumenta de forma significativa a sua capacidade de serviço aos clientes,nomeadamente nas disponibilidades de tesouraria"

A CGD afirma que a CGD não ficará "parada no tempo,agarrada a um passado que já não existe" e que os planos de transformação visam "garantir o futuro hoje".

Além da redução de agências e de serviços bancários no interior,a Deco afirma que mesmo nas cidades maiores os encerramentos de balcões,os fechos nas horas de almoço e as limitações nos horários da tesouraria faz com que seja cada vez mais difícil ir a um balcão e leva mesmo a filas de clientes à porta de agências.

Além disso,afirmou Nuno Rico,os serviços bancários digitais são gratuitos ou mais baratos numa primeira fase,mas à medida que se tornam muito usados passam a ser "onerados de forma significativa".

O encerramento de agências e diminuição de trabalhadores bancários tem sido,na última década,transversal a toda a Europa e com contestação de populações e autarcas.

Em 2022,em Espanha,um homem de 78 anos (cirurgião reformado e doente de Parkinson) fez uma petição a pedir menos Internet e mais atenção humana nas sucursais bancárias e chegou a conseguir mais de 600 mil assinaturas.

Segundo os últimos dados do Banco de Portugal,em 2022,o número de agências bancárias era de 4.626,menos 3.090 do que em 2012.